Qual o papel da Sociologia na Análise do Comportamento?



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A Análise do Comportamento trata de três níveis de seleção, como descrito por Skinner (1981). O primeiro nível é o filogenético, que diz respeito à história evolutiva da espécie, campo das ciências biológicas focadas no funcionamento do organismo. Neste nível encontram-se todos os comportamentos respondentes e outras predisposições genéticamente determinadas ou influênciadas. O segundo nível é o ontogenético, que trata da história de vida do sujeito, campo relacionado à psicologia e outras ciências comportamentais focadas no comportamento de um organismo individual. Neste campo, estão os estudos sobre aprendizagem e desenvolvimento. O terceiro nível é o da cultura, que trata de práticas culturais e da sobrevivência das culturas, seara de ciências como a sociologia e a antropologia, que trata do comportamento de um grupo de indivíduos. Os três níveis se sobrepõem, e uma determinada instância de comportamento pode atravessar mais de um nível. O comportamento humano, em quase toda sua ocorrência, atravessa os três níveis.

Históricamente, a Análise do Comportamento sempre voltou a maior parte de seus esforços científicos ao segundo nível de análise, o que era de se esperar, na medida em que é uma disciplina nascida na Psicologia. Entretanto, diversos pesquisadores ao longo das décadas tentaram diferentes aproximações com disciplinas sociológicas para estudar o terceiro nível de análise. Alguns dos trabalhos nessa linha que obtiveram algum destaque foram os livros Behavioral Sociology (Bushell & Burguess, 1969), Analysing Social Behavior (Guerin, 1994) e a série de artigos de Sigrid Glenn sobre as metacontingências, possíveis unidades de análise adequadas para o estudo de fenômenos sociais (Glenn, 1986, 1988, 1991). Há também um periódico científico chamado Behavior and Social Issues, de acesso livre, voltado exclusivamente ao estudo de processos sociais, em grande parte, sob a ótica da Análise do Comportamento. Segue o link: http://www.behaviorandsocialissues.org/

No Brasil existem vários pesquisadores trabalhando empírico e conceitualmente neste terceiro nível de seleção. Há um grupo de alunos da PUC-SP que mantém um rico blog sobre o tema ( http://accultura.wordpress.com/ ). Há também um grupo de pesquisa na UFPA que busca análogos de práticas sociais em miniculturas criadas em laboratório, a partir de procedimentos adaptados da Psicologia Social do Sec. XX. Além disso, recentemente foi publicado o trabalho de um pesquisador brasileiro (Tourinho 2009), que apresenta uma poderosa interpretação da subjetividade humana, sob ótica comportamental, a partir de uma análise historiográfica dos costumes da sociedade ocidental aliada à noção de processo civilizador, do célebre sociólogo Norbert Elias, conjuntamente com o conceito de eventos privados, de B.F.Skinner. Um claro e bem sucedido exemplo de interdisciplinariedade da Análise do Comportamento com as ciências sociais.

Desta forma, a interação entre Análise do Comportamento e Sociologia é inevitável. Na medida em que se estude comportamento humano processos sociais estarão inevitavelmente envolvidos, e nesse ponto, a sociologia se mostra uma excelente bibliografia, assim como a Psicologia Social.

Uma questão interessante a se levantar neste momento, é a inversa: qual o papel da Análise do Comportamento na Sociologia?

Assim como é necessário conhecer o organismo que se comporta (filogênese) para se ter uma base para estudar como e porque ele se comporta (ontogênese), também é necessário entender como os organismos individualmente se comportam, para se ter uma base para entender a origem e manutenção de processos sociais (culturais). Nesse ponto, a Análise do Comportamento certamente oferece uma gama de novos paradígmas profícuos para a Sociologia em geral.

Att. Hernando Neves Filho
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Referências

Burgues, R. L.; Bushell, D. (1969). Behavioral Sociology: the Experimental Analysis of Social Process. New York: Columbia University Press.

Guerin, B. (1994). Analyzing social behavior: Behavior Analysis and the Social Sciences. Reno: Context Press.

Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences Science, 213, 501-504 : 10.1126/science.7244649

Glenn, S. S. (1986). Metacontingencies in Walden Two Behavior Analysis and Social Action, 5, 2-8

Glenn, S. S. (1988). Contingencies and metacontingencies: Toward a synthesis of behavior analysis and cultural materialism The Behavior Analyst (11), 161-179 : PMC2741963

Glenn, S. S. (1991). Contingencies and metacontingencies: Relations among behavioral, cultural, and biological evolution. Em P. A. Lamal (Orgs), Behavioral analysis of societies and cultural practices (pp. 39-73). Washington, DC: Hemisphere.

Tourinho, E. Z. (2009). Subjetividade e Relações Comportamentais. Editora Núcleo Paradigma. São Paulo. [Pode ser adquirido no site da editora]