A família e o comportamento

Pergunta: "O comportamento é até sinônimo de cultura, determinismo, arbítrio e influência. Qual o papel da família nisso tudo?"

Via formspring.me/Comportamento
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Antes de falar da família, falarei de comportamento, cultura, determinismo, arbítrio e influência.

- Determinismo é a “teoria filosófica de que todo acontecimento (...) é explicado (...) por relações de causalidade”.
- Arbítrio é uma “determinação dependente apenas da vontade”.
- Comportamento é uma relação entre organismo e ambiente (Borges, 2009). Não é determinado pela vontade nem por relações de causalidade, mas sim por relações funcionais, isto é, interações probabilísticas com várias “causas” possíveis e nenhuma agindo de modo mecanicista (http://bit.ly/ackqPQ). O comportamento operante é função de níveis de seleção: filogenético, ontogenético e cultural (http://bit.ly/apdkoQ).
- Cultura é um conjunto de eventos ambientais sociais que contribui em um nível de seleção do comportamento (Skinner, 1981).
- Influência é a “ação de uma pessoa ou uma coisa sobre outra”. Logo, o responder de um organismo é influenciado pela ação das pessoas que fazem parte de seu ambiente cultural, de maneira multideterminada e probabilística.

ResearchBlogging.orgA família é um grupo de pessoas que participa do ambiente sócio-cultural de um indivíduo. Também fazem parte desse ambiente a escola, o trabalho, a religião, o governo, entre outras. Todas essas agências controladoras (Skinner, 1953) modificam o comportamento do indivíduo e do grupo. Mas como ela controla? Por contingências de reforçamento (ou por coerção). Falemos das contingências de reforçamento.

Reforçamento é o aumento da freqüência de respostas de um organismo em função de um reforçador. E reforçador é a função contingente de um evento ambiental, posterior a uma resposta, e que aumenta a probabilidade de ocorrência dela na presença de um outro evento ambiental antecedente.

A família é provedora de potenciais reforçadores às pessoas desde o nascimento até um período indeterminado da idade adulta. Os reforçadores podem ser sociais, como conversas amistosas, ou físicos, como dinheiro. Assim sendo, a família exerce sua influência sobre o indivíduo através de relações operantes.

Em Análise do Comportamento, há um conceito importante no estudo das relações comportamentais entre grupos culturais: metacontingências. Contingência é uma relação funcional entre eventos. No caso do comportamento, estamos falando de organismo e ambiente. A metacontingência é algo que está além de uma contingência simples que envolva o foco de análise nas respostas de um indivíduo, nas alterações que essas respostas ocasionam no ambiente e como o ambiente retroage sobre o indivíduo.

Metacontingência é o conjunto de contingências entrelaçadas, que gera um produto agregado a partir de operantes de vários indivíduos e um sistema receptor que seleciona essas relações (Glenn & Malott, 2004). Este produto agregado não é cumulativo, como no caso de uma macrocontingência. O produto agregado difere do acumulado na medida em que não é formado pela somatória do produto das respostas de cada indivíduo do grupo, mas sim pelas interações entre esses indivíduos.

Por exemplo, o sucesso de um time em jogo de futebol depende da ação de todos os jogadores. A vitória em tempo normal de jogo é um produto agregado, pois foi formado a partir das contingências entrelaçadas do comportamento de cada jogador. Caso a disputa fosse definida em pênaltis, a vitória seria um produto acumulado, pois seria fruto do somatório da ação de cada jogador separadamente. Ambos os tipos de produto fazem seleção do repertório comportamental de cada indivíduo.

Na família, há macrocontingências como quando você quer pintar seu quarto e daria muito trabalho fazê-lo sozinho. Se você, seus pais e seus irmãos pintarem juntos, a resposta de pintar será reforçada efetivamente pela conseqüência “paredes pintadas” e gerará um produto acumulado “quarto pintado rapidamente e com pouco esforço”. Também há metacontingências: em uma família com histórico de relações sociais reforçadoras, cada membro da família exerce controle sobre o comportamento do outro (contingências entrelaçadas), que promovem o bom convívio da família, a participação de todos nas atividades rotineiras como refeições, limpeza e entretenimento (produto agregado), sendo que esse modelo de interação social familiar é selecionado pela igreja, pelo governo, pelos programas de TV etc (sistema receptor).

Quanto ao nível de influência da família em detrimento da influência de outros grupos culturais, a Psicologia Social fala sobre dois tipos de inserção cultural: a Socialização Primária e a Socialização Secundária (Gomes, 1994). Socialização primária corresponde às primeiras influências na vida de um indivíduo, influências essas que compõe a “personalidade” (entendida aqui como algo em constante mudança em função das variáveis ambientais) desse indivíduo, isto é, que modela o repertório social básico, tornando o indivíduo apto a viver em sociedade. As influências ocorridas após esse período, ou as novas inserções sociais do indivíduo em novos grupos sociais é a Socialização Secundária. Em geral, a família faz parte do processo de Socialização Primária e é o grupo social que mais frequentemente perdura ao longo da vida do indivíduo.


Outros grupos como amigos de vizinhança, ou colegas e professores do colégio, que podem também fazer parte da Socialização Primária, na maioria das vezes se dissipa com o passar do tempo. A Psicologia Social diz que a Socialização Primária é mais efetiva e mais influente sobre a vida das pessoas, ou seja, há muitas coisas estabelecidas por essa Socialização que são difíceis de serem mudadas pela Socialização Secundária. Não entrarei nas discussões apresentadas pela Psicologia Social por não achá-las pertinentes à análise comportamental e por falta de repertório pessoal mais amplo sobre o assunto.

Pela Análise do Comportamento, por que a Socialização Primária seria mais efetiva que a Secundária? Porque essas influências iniciais são mais freqüentes por um período mais extenso que as demais. E família, quando é um grupo responsável pela Socialização Primária e mantém-se freqüente na vida do indivíduo por período indeterminado, as contingências de reforçamento (especialmente as entrelaçadas) estão bastante estabelecidas e garantem a manutenção de um mesmo tipo de repertório.

Logo, a família é personagem importante na formação do repertório comportamental. O seu grau de controle sobre esse repertório varia em função história das relações sociais mantidas entre os membros dessa família. Um indivíduo que sempre teve pouca interação com a família, ou manteve relações aversivas, provavelmente será menos influenciado pelas contingências (ou metacontingências) familiares enquanto estiver distante dela. Todavia, cada caso é um caso. Não há receita geral do grau de influência da família na vida de alguém, pois seu repertório é função de todas as muitas interações sociais e, na vida contemporânea, via internet, essas relações podem ser estendidas ao mundo inteiro, classificando a família como mais uma das possíveis agências controladoras do repertório social dos indivíduos.


Rubilene

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Referências


Borges, R. P. (2009). Comportamento: resposta ou relação? Anais do XVIII Encontro da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental.
Glenn, S. S., & Malott, M. E. (2004). Complexity and Selection: implications for organizational change. Behavior and Social Issues, 13, 89-106.

Gomes, J. V. (1994). Socialização Primária: tarefa familiar? Cadernos de Pesquisa, 91, 54-61.

Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences. Science, 213, 501-504.

Skinner, B. F. (1953).Science and Human Behavior. New York: Macmillan.

Sugestão de leitura sobre Metacontingências em família:

Naves, A. R. C. X. (2008). Contingências e metacontingências familiares: um estudo exploratório. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciência do Comportamento. Universidade Federal de Brasília. PDF

Como criar uma psicopatologia, parte I


Não sou um especialista em psicopatologia. Pouco estudei e pouco conheço. Todavia, como bom behaviorista radical, olho com certa suspeita o campo todo. Patologia não cai bem em um modelo selecionista.

Todo aluno de psicologia passa por uma disciplina com esse tópico, onde invariavelmente, para o deleite da turma, todo mundo encontra um pouquinho de si nas descrições das patologias da mente humana. É a conquista do mundo doente que os psicanálistas edificaram em seus escritórios. Todos temos, em algum nível pouco claro, uma patologia mental. E a tendência é que fiquemos mais doentes. Vem ai o DSM5! [http://www.dsm5.org/]

Para os não iniciados, o DSM é um manual psiquiátrico com todas as descrições possíveis de centenas de patologias mentais. Tudo que você fizer em excesso ou em falta, indicará algumas dezenas de problemas, todos na sua cabeça, claro. Se você joga videogame demais, você é um doente, dirá o manual. Não interessam os motivos, ele repete: você é doente. Reducionismo molecularista dos melhores.

Em uma materia do PsychiatricTimes, intitulada Normality Is an Endangered Species: Psychiatric Fads and Overdiagnosis (Frances, 2010), o autor afirma que a normalidade é uma espécie em extinção, devido um processo de overdiagnosis, que seria uma mania de psiquiatra de classificar qualquer comportamento como patológico, seja com base em sua frequência, função ou topografia. O trecho é revelador.

The NIMH estimates that, in any given year, 25 percent of the population (that’s almost 60 million people) has a diagnosable mental disorder. A prospective study found that, by age thirty-two, 50 percent of the general population had qualified for an anxiety disorder, 40 percent for depression, and 30 percent for alcohol abuse or dependence. Imagine what the rates will be like by the time these people hit fifty, or sixty-five, or eighty. In this brave new world of psychiatric overdiagnosis, will anyone get through life without a mental disorder?
Os crentes do DSM afirmam que praticamente toda população humana é doente mental em alguma medida, o que fazer? Medicamentos. Para o deleite de uma das mais poderosas indústrias do mundo moderno. Até ai tudo bem para os pouco céticos. Os resultados dos tratamento psiquiátrico a base de medicamentos todos já sabem: risíveis. Não é por nada que dizem que a psiquiatria está em crise em meio a movimentos anti-psiquiátricos dos mais variados tipos.


Vídeo 1. Sensacionalista, porém fiel aos fatos. Psiquiatras admitem a inexistência de testes científicos que comprovam doenças mentais e que não tem curas para estas "doenças".

ResearchBlogging.orgAgora os mais inquietos podem se perguntar: de onde vêm essas doenças? Genética de erros, que sobreviveu às imposições da seleção natural? Possível. Cérebro defeituoso? Igualmente possível. Essas são as principais apostas da comunidade médica, entretanto, até então as evidencias que suportem estas hipóteses são, segundo alguns, bem fracas. Qual seria outra possível fonte dessas doenças? Comportamento verbal? Bingo!

Em um Wittgensteinianismo Radical, poderíamos dizer que o estudo do uso da linguagem cotidiana não só acaba de vez com os problemas filosóficos, como também acaba com os problemas supostamente dentro da sua cabeça.

Uma matéria que facilita este insight se chama The Americanization of Mental Illness, publicada no New York Times. Nela, o autor apresenta as idéias do psiquiatra chines Sing Lee, que descreve muito acertadamente que patologias mentais não são entidades discretas com uma história biológica e evolutiva própria, como o vírus da pólio, por exemplo. Através de dados antropológicos é possível afirmar que as psicopatologias, essas muito bem documentadas no DSM, nunca foram estáticas e de ocorrência global, mas sim, são tipicamente eventos sociais (cf. Pessoti, 2006). Claro que nesses casos não se incluem síndromes de determinação claramente biológica, como o autismo. De qualquer forma, seria simplesmente impossível existir uma síndrome de abuso de vídeo game no séc XIX. De forma menos drástica, seria muito improvável encontrar um caso dessa mesma psicopatologia em uma comunidade palpérrima da África sub-saariana, entretanto, com o devido serviço de divulgação, é possível encontrar um caso por lá.


"For more than a generation now, we in the West have aggressively spread our modern knowledge of mental illness around the world. We have done this in the name of science, believing that our approaches reveal the biological basis of psychic suffering and dispel prescientific myths and harmful stigma. There is now good evidence to suggest that in the process of teaching the rest of the world to think like us, we’ve been exporting our Western “symptom repertoire” as well. That is, we’ve been changing not only the treatments but also the expression of mental illness in other cultures. Indeed, a handful of mental-health disorders — depression, post-traumatic stress disorder and anorexia among them — now appear to be spreading across cultures with the speed of contagious diseases. These symptom clusters are becoming the lingua franca of human suffering, replacing indigenous forms of mental illness.
Hora de citar um clássico:

Toda era tem sua loucura peculiar. Algum plano, projeto ou fantasia em que mergulha, estimulada pelo amor do ganho, pela necessidade de emoção ou pela simples força da imitação. Se tudo isso falhar, ela ainda sim possui uma loucura a que é incitada por causas politicas ou religiosas, ou por ambas combinadas.
Extraordinary Popular Delusions and the Madness of Crowds, Charles Mackay

Difícil discordar, mas há o que se acrescentar. Hoje em dia, no ethos globalizado, as mais fortes loucuras ( as mais lucrativas lucrativas) predam as mais fracas, e a resistência é pequena. Há não muito tempo atrás, era comum se ver cirurgias amadoras, realizadas em praça pública, de retiradas de 'pedras' da cabeça de doentes. Pedras que somente os cirurgiões enxergavam, e que eram eliminadas da vista de todos assim que retiradas da cabeça do enfermo. Isso parece que morreu (não antes de matar bastante), entretanto, loucuras da mesma época ainda persistem, por serem fortes (lucrativas). Em um mundo onde grande parte da população procura sua personalidade e a predição do futuro no posicionamento de astros de um sistema cosmológico arbitrário e fictício (uma loucura das lucrativas, digo, fortes), nada mais plausível do que a aceitação crédula e passiva das palavras de uma autoridade médica, mesmo que, segundo seus próprios preceitos, essa autoridade certamente seja também uma doente mental.

De qualquer forma, a pergunta persiste: de onde vêm essas doenças? É hora de falar de comportamento verbal. Em outro post.

Obs.: Atente que o conteúdo que o autor aqui apresentou não foi avaliado por seus pares. O que caracteriza tudo como um mero exercício de crítica e mau humor. Note também que não há um desmerecimento desregrado com a psiquiatria. Há sim o velho e ranzinza ceticismo em sua boa forma.
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Bibliografia

Pessotti, I. (2006). Sobre a teoria da loucura do séc. XX Temas em Psicologia, 14 (2) [PDF]

Frances, A. (2010). Normality Is an Endangered Species: Psychiatric Fads and Overdiagnosis. The Psychiatric Times. [ Acesso, requer inscrição ] - [ Uma curiosidade, ao se inscrever no sítio do Psychiatric Times, há um campo para preencher com sua 'profissão'. Vejam as opções na imagem abaixo. Clique para ampliar.]


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Update


A plasticidade cerebral de Karl Lashley


Karl Lashley foi aluno de John Watson e, consequentemente, um dos primeiros expoentes da primeira geração de behavioristas americanos. Chegou a escrever um artigo sobre a interpretação da consciência segundo o behaviorismo watsoniano (Lashley, 1923a, 1923b), aderindo à pratica comum em psicologia de traduzir velhas idéias em novos jargões. Entretanto a maior contribuição de Lashley para a ciência se deu a partir de experimentos no que hoje chamaríamos de neurociência. Lashley aprendeu com Watson, que aprendeu com Loeb (Boakes, 1984), o poder da explicação cerebral sobre o comportamento, e partindo disso, dedicou grande parte de sua carreira estudando o cérebro de ratos, em experimentos minuciosamente planejados que estudavam o efeito de ablações (um procedimento cirúrgico de retirada de grandes porções do cérebro) sobre a aprendizagem, em especial a aprendizagem de labirintos (método padrão da época, muito antes das caixas de condicionamento operante). Uma das afirmações mais veementes de Lashley versava sobre a plasticidade cerebral, muitas décadas antes dela explodir como uma vedete queridinha da neurociência moderna.

Recentemente dei de encontro com um post chamado "Neural plasticity isn’t new" em um blog afiliado a ResearchBloggin. O autor aponta que muitos trabalhos em neurociência (em geral blogs) vem apontando erroneamente que a plasticidade neural foi uma das grandes descobertas das últimas décadas. A partir disso, o autor do post mostra que a idéia já circulava robustamente há muito mais tempo pela literatura científica. Apartir de uma breve recoleção de citações muito bem escolhidas, o post chega até os trabalhos famosos do psicólogo canadense Donald O. Hebb, da década de 1940, como precursores da plasticidade cerebral. Entretanto, nada foi falado sobre o behaviorista Karl Lashley. Uma pena, pois Donald O. Hebb, foi aluno de Lashley (Boakes, 1984).


Vídeo 1. Pequeno documentário sobre a carreira de Donald O. Hebb.

Antes de Donald Hebb lançar sua afamada obra, os resultados de Lashley, seu professor, nos estudos de ablação apontaram que a a retirada de tecido cerebral (em especial de áreas do cortex cerebral) deteriora em diferentes medidas o desempenho de um sujeito, tanto em tarefas que ele já aprendeu, quanto na aprendizagem, de novas tarefas. Entretanto, o desempenho não se deve ao local da lesão, e sim à quantidade de tecido destruído (Gardner, 1985). Os dados eram claros: quanto maior a lesão, pior o desempenho, independente da localização da lesão.


"Todas as células do cérebro estão constamente ativas e participando, por uma espécie de soma algébrica, de toda atividade. Não existem células especiais reservadas para memórias especiais" (Lashley, 1950, p. xi).
Lashley estava lançando um desafio à duas fortes tendências dos estudiosos do cérebro: o localizacionismo e o reducionismo. Para Lashley, era o cérebro como um todo o responsável pelo ordenamento do comportamento, e seu professor, Watson, já dizia que era o organismo como um todo que se comportava (Watson, 1972, p 28). Sim, não foi Skinner quem inventou isso. Lashley foi bastante incisivo em dizer que não haviam áreas específicas para comportamentos específicos, a revelia de achados duvidosos e sistematicamente questionados de Broca e Wernicke (cf. Marie, 1906), que afirmaram ter encontrado circunvoluções cerebrais fortemente ligadas à fala (Gardner, 1985). Entretanto, apesar do início atrapalhado nas afirmações de Broca e Wernicke, hoje o localizacionismo (não tão restrito como em suas primeiras formulações) é real e aceito indiscutivelmente na comunidade científica. Neste tópico, ocorreu algo comum quando duas propostas antagônicas são fortemente discutida a luz de dados conflitantes: a reconciliação da antiga dicotomia em um continuum. A ordenação do comportamento é resultado do funcionamento do cérebro como um todo, entretanto, existem claras áreas cerebrais que possuem preponderância na ocorrência de determinadas funções comportamentais (Gardner, 1985). Donald O. Hebb, o aluno de Lashley, foi um dos primeiros a ordenar o continuum entre o localizacionismo e o holismo cerebral, em sua obra clássica, The Organization of Behavior, de 1949 (Gardner, 1985). O holismo cerebral irrestrito de Lashley, que o aproximou da fantástica psicologia da Gestalt, hoje é mera curiosidade histórica, produto da pouco refinada técnica disponível na época, a ablação. Entretanto, o mesmo não pode ser dito sobre sua crítica ao reducionismo. Até hoje, por mais que jornalistas incautos anunciem, ninguém afirma que o cérebro explica instâncias específicas de comportamento, pois isso é reducionismo.

Os dados que sustentaram a posição holista ortodoxa de Lashley foram os resultados que apontaram uma capacidade de partes intactas do cérebro assumirem o controle de uma propriedade cerebral quando partes fortemente relacionadas a esta propriedade fossem destruídas (Gardner, 1985). Lashley chamou este fenômeno de plasticidade cerebral, em "Brain Mechanisms and Intelligence", em 1929.

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Karl Lashley foi o motor da virada do pêndulo entre o localizacionismo extremo e o holismo igualmente extremo. Foi a partir de uma grande quantidade de dados e de criticas audaciosas (bem aos moldes de seu professor, Watson) que Lashley provocou a neurociência a rever sua epistemologia remanescente da frenologia, lançando à comunidade científica um robusto conjunto de evidências empíricas que davam indícios da versatilidade impressionante do cérebro animal.

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Bibliografia

Boakes, R. (1984). From Darwin to behaviorism: psychology and the mind of animals. Cambridge University Press. [Google Books]

Gardner, H. (1985). A nova ciência da mente. 3ª edição. Edusp. São Paulo.

Hebb, D. O. (1949). The organization of behavior. New York, John Wiley.

Lashley, K. (1923). The behavioristic interpretation of consciousness. I. Psychological Review, 30 (4), 237-272 DOI: 10.1037/h0073839

Lashley, K. (1923). The behavioristic interpretation of consciousness ii. Psychological Review, 30 (5), 329-353 DOI: 10.1037/h0067016

Lashley, K. S. (1929). Brain mechanisms and inteligence. Chicago, University of Chicago Press.

Lashley, K. S. (1950). In search of the engram. Symposia of the Society for Experimental Biology. 4: 454-482.

Marie, P. (1906). Révision de la question de l'aphasie. Semaine Médicale, 21, 241-247.

Watson, J. B. (1972). El conductismo. 4ª edición. Editorial Paidos, Buenos Aires. [Compre na Estantevirtual] ou [Baixe a Versão original, em inglês, disponível na íntegra]

Um arquetipo comum existe em termos de comportamento? Como um senso, ou melhor, consenso?



Sim. Todo comportamento é selecionado por suas consequências.

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É uma premissa antiga, e fácil de ser observada. Uma de suas primeiras formulações foi ainda na filosofia do Séc. XIX, no princípio de Spencer-Bain. Dois filósofos (Herbert Spencer e Alexander Bain) afirmaram e argumentaram, a partir da lógica filosófica da época, que à toda ação que se segue um resultado benéfico, pratico ou emocional, há um fortalecimento. O inverso também foi afirmado: a toda ação a qual se segue algo desagradável, há um enfraquecimento. Segundo estes filósofos, o pareamento de emoções positivas e negativas com a ação era a responsável pelo fortalecimento ou enfraquecimento das ações em ocorrências futuras.

No início do Sec. XX, o pioneiro Psicólogo Experimental E. L. Thorndike apresentou uma das primeiras leis científicas sobre a aprendizagem, a lei do efeito.

Fig 1. Um exemplo da puzzle-box utilizada por caixa (a esquerda) e uma típica curva de aprendizagem, demonstrativa da lei do efeito (a direita).

Tratava-se de uma demonstração empírica do princípio de Spencer-Bain. Thorndike demonstrou numa série de experimentos, com sujeitos de diferentes espécies, que determinados comportamentos, que produziam consequências benéficas ao sujeito, em determinadas situações, tendiam a ter ocorrência predominante em situações similares. Um dos exemplos clássicos dados por Thorndike é o do gato na caixa-problema. Um gato qualquer, quando colocado preso no interior de uma caixa-problema, a qual ele nunca antes teve contato, começa a apresentar uma série de diferentes comportamentos. Eventualmente, de gato pra gato, o animal acaba descobrindo o mecanismo que abre a portinhola da caixa (um pequeno ferrolho escondido em um dos cantos da caixa). A partir disso, toda vez que o gato é re-exposto a situação da caixa-problema, a resposta que produz a abertura da portinhola se torna preponderante em relação as que outrora também ocorreram nesta mesma situação. Thorndike então, na mesma linha de raciocíno de Spencer e Bain, argumenta que comportamentos que produzem efeitos prazeirosos são fortalecidas, e comportamentos que produzem efeitos desagradáveis são enfraquecidos. (Esta é a formulação da Lei do efeito forte de Thorndike. Posteriormente, este autor descartou a noção de enfraquecimento do comportamento, e esta noção ficou conhecida como a Lei do efeito fraca).

Vídeo 1. Parte de um documentário, de origem desconhecida, sobre Thorndike.

Entretanto, a mediação do aumento ou diminuição da frequência do comportamento por agentes emocionais vagos e pouco claros comprometeu a aceitação destes dois modelos.

B.F. Skinner, já na segunda metade do Séc.XX, apontou uma saída às explicações mediacionais embaraçosas: o modelo de seleção pelas consequências. Segundo o famoso biólogo e divulgador da ciência Richard Dawkins, "Seleção pelas consequências" é uma boa frase (Dawkins, 1984), pois da ênfase ao ambiente e seus processos seletivos (Laurenti, 2009). Neste modelo, o comportamento é selecionado (aos mesmos moldes da seleção natural) pelas consequências que o seguiram, contigua e contingêntemente, em situações anteriores, em ordem probabilística. Desta forma, uma resposta "R", que ocorre em um contexto "Sd" e produz uma consequência "S", será selecionada pela função que aquela consequência "S" teve. Se em situações futuras, no mesmo contexto "S", ou em contexto similar (variando em um ou vários aspectos) aquela resposta volta a ocorrer com predominância, podemos afirmar que o estímulo "S" selecionou aquela resposta, e é portanto, para os iniciados, um S+ (princípio da aprendizagem operante). O modelo de seleção por consequências rompe com os anteriores por adotar uma postura probabilística. Não há um agente causador 1:1, não há causa e efeito mecanicista, há sim um controle contextual e uma seleção da variação que cria uma relação funcional entre uma gama de diferentes eventos. O princípio de Spencer-Bain e a lei do efeito de Thorndike, ao postular que as consequências criam sensações ou emoções internais, adota um modelo causal mecanicista, de causa e efeito, mediacional, onde é a sensação interior que causa, em proporção rígida, o comportamento. Tal rigidez é deixada de lado no modelo de seleção pelas consequências, já que nele, a medição do comportamento é feita com base na probabilidade de sua ocorrência. Determinados contextos e determinadas histórias pessoais aumentam ou diminuem a probabilidade de uma gama distinta de classes de resposta, que estão em constante vias de seleção pelas consequências que as seguem.

Texto de Hernando Neves Filho
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Referências

Dawkins, R. (2010). Replicators, consequences, and displacement activities Behavioral and Brain Sciences, 7 (04) DOI: 10.1017/S0140525X00026790

Laurenti, C. (2009). Criatividade, liberdade e dignidade: impactos do darwinismo no behaviorismo radical Scientle studia [PDF via SciELO]

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Bibliografia

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Sobre a lei de Spencer-Bain
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Bain, A. (1902). The senses and the intelect. New York : D. Appleton and Company.
- Obra original de Alexander Bain, pode ser baixada na íntegra aqui: http://www.archive.org/details/sensesintellect00bain

Boakes, R. (1984). From Darwin to behaviorism: psychology and the mind of animals. Cambridge University Press.
- Um excelente livro de história da psicologia experimental. Leitura recomendadíssima! A discussão sobre o princípio de Spencer-Bain se encontra no capítulo 1.

Spencer, H. (1873). The principles of psychology. New York : Appleton.
- Obra original de Spencer, pode ser baixada na íntegra aqui: http://www.archive.org/details/principlespsych35spengoog

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Sobre a Lei do Efeito, de Thorndike
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Thorndike, E. L. (1911). Animal inteligence: experimental studies. The Macmilliam Company.
- Histórica tese de doutoramento de Thorndike, onde há um grande número de demonstrações empíricas de sua lei do efeito. Pode ser baixado na íntegra aqui: http://www.archive.org/details/animalintellige00thorgoog

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Sobre o modelo de Seleção por Consequências
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Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences Science, 213, 501-504 : 10.1126/science.7244649
- Artigo clássico onde Skinner apresenta sucintamente seu modelo. O .pdf traduzido pode ser adquirido aqui: http://www.bfskinner.org/BFSkinner/Brazil_files/Selecao_por_consequencias.pdf

Homossexualismo, qual a análise do dia sobre isso?

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ResearchBlogging.orgNão é bem uma análise do dia, mas é, provavelmente, a análise mais recente e "moderna" do assunto. Menezes (2005) fez, em sua dissertação de mestrado, um compêndio sobre sexualidade humana e discussões de comportamento inato X aprendido. As conclusões da revisão da literatura e da análise crítica das linhas de pesquisa sobre homossexualidade (dentre elas as categorias "medidas hormonais", "efeitos hormonais", "genética", "funcionamento cerebral", "modelos animais" e "efeitos ambientais") apontam que a sexualidade humana e de outras espécies pode ter propensão biológica para heterossexualidade e para homossexualidade, mas não sendo a biologia a variável determinante absoluta do comportamento sexual. A idéia de um "gene gay" está pra lá de obsoleta. Bem como pode ser considerada obsoleta a idéia de que sexo tem por função apenas a reprodução nas demais espécies.

O bonobo (Pan paniscus) é uma espécie de primata geneticamente muito próxima ao homem e ao chimpanzé (Pan troglodytes) e apresenta comportamentos sociais intrigantes. Em primeiro lugar, a hierarquia social é definida pelo parentesco com as fêmeas do grupo e não pelos machos como na maioria das espécies primatas (de Waal, 1999). Em segundo lugar, o contato sexual é parte frequente e até decisiva nas relações sociais. Situações de conflito como em disputa por comida são geralmente amenizadas por contato sexual entre um macho e uma fêmea ou dois machos ou duas fêmeas e até mesmo entre adultos e infantes. Alianças também são formadas por contato sexual. Há contato sexual após comida farta e após passsagem de perigo etc.



Podemos considerar, então, que todo ser humano nasce potencialmente bissexual, sendo que as variações na sua sexualidade serão função das influências do ambiente social. Há pessoas com os mais variados tipos de expressão sexual entre o heterossexual exclusivo e o homossexual exclusivo. Há pessoas que são bissexuais e dizem sentir-se atraídas igualmente por ambos os sexos. Outras são mais atraídas pelo sexo oposto, outras mais pelo mesmo sexo. Há ainda pessoas que apresentam características anatômicas e/ou comportamentais do sexo oposto e são atraídas pelo mesmo sexo, mas outras são atraídas pelo sexo oposto. É uma variedade enorme que está a mercê de variáveis biológicas e ambientais produzindo indivíduos comportamentalmente muito distintos.



Qual deles é mais normal? Todos. Cientificamente não cabe atribuir juízos de valor ao comportamento e rotulá-lo como bom ou ruim, como certo ou errado. Os seres humanos são fruto da história (Skinner, 1981) de sua espécie (filogenia), de sua vida pessoal (ontogenia) e dos grupos a que pertence (cultura ou sociogenia). O comportamento do homossexual é tão fruto da história quanto daquele que o apedreja.

Obrigada por perguntar.

Att,
Rubilene.

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Referências

de Waal FB (1999). The end of nature versus nurture. Scientific American, 281 (6), 94-9 PMID: 10614071

Menezes, A. B. C. (2005). Análise da Investigação dos Determinantes do Comportamento Homossexual Humano. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento. Universidade Federal do Pará. (pode ser obtida no site http://www.ufpa.br/ppgtpc/ )

Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences Science, 213, 501-504

Leituras mais rápidas de Menezes:

Menezes, A. B. C. & Brito, R. (2007). Reflexão sobre homossexualidade como subproduto da evolução do prazer. ComCiência, 0, 1-4.

Menezes, A. B. C. & Carvalho Neto, M. B. (2010). Evolução histórica do conceito de comportamento homossexual humano. Faz Humanidades, 3, 159-165.
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UPDATE

Qual o papel da Sociologia na Análise do Comportamento?



ResearchBlogging.org
A Análise do Comportamento trata de três níveis de seleção, como descrito por Skinner (1981). O primeiro nível é o filogenético, que diz respeito à história evolutiva da espécie, campo das ciências biológicas focadas no funcionamento do organismo. Neste nível encontram-se todos os comportamentos respondentes e outras predisposições genéticamente determinadas ou influênciadas. O segundo nível é o ontogenético, que trata da história de vida do sujeito, campo relacionado à psicologia e outras ciências comportamentais focadas no comportamento de um organismo individual. Neste campo, estão os estudos sobre aprendizagem e desenvolvimento. O terceiro nível é o da cultura, que trata de práticas culturais e da sobrevivência das culturas, seara de ciências como a sociologia e a antropologia, que trata do comportamento de um grupo de indivíduos. Os três níveis se sobrepõem, e uma determinada instância de comportamento pode atravessar mais de um nível. O comportamento humano, em quase toda sua ocorrência, atravessa os três níveis.

Históricamente, a Análise do Comportamento sempre voltou a maior parte de seus esforços científicos ao segundo nível de análise, o que era de se esperar, na medida em que é uma disciplina nascida na Psicologia. Entretanto, diversos pesquisadores ao longo das décadas tentaram diferentes aproximações com disciplinas sociológicas para estudar o terceiro nível de análise. Alguns dos trabalhos nessa linha que obtiveram algum destaque foram os livros Behavioral Sociology (Bushell & Burguess, 1969), Analysing Social Behavior (Guerin, 1994) e a série de artigos de Sigrid Glenn sobre as metacontingências, possíveis unidades de análise adequadas para o estudo de fenômenos sociais (Glenn, 1986, 1988, 1991). Há também um periódico científico chamado Behavior and Social Issues, de acesso livre, voltado exclusivamente ao estudo de processos sociais, em grande parte, sob a ótica da Análise do Comportamento. Segue o link: http://www.behaviorandsocialissues.org/

No Brasil existem vários pesquisadores trabalhando empírico e conceitualmente neste terceiro nível de seleção. Há um grupo de alunos da PUC-SP que mantém um rico blog sobre o tema ( http://accultura.wordpress.com/ ). Há também um grupo de pesquisa na UFPA que busca análogos de práticas sociais em miniculturas criadas em laboratório, a partir de procedimentos adaptados da Psicologia Social do Sec. XX. Além disso, recentemente foi publicado o trabalho de um pesquisador brasileiro (Tourinho 2009), que apresenta uma poderosa interpretação da subjetividade humana, sob ótica comportamental, a partir de uma análise historiográfica dos costumes da sociedade ocidental aliada à noção de processo civilizador, do célebre sociólogo Norbert Elias, conjuntamente com o conceito de eventos privados, de B.F.Skinner. Um claro e bem sucedido exemplo de interdisciplinariedade da Análise do Comportamento com as ciências sociais.

Desta forma, a interação entre Análise do Comportamento e Sociologia é inevitável. Na medida em que se estude comportamento humano processos sociais estarão inevitavelmente envolvidos, e nesse ponto, a sociologia se mostra uma excelente bibliografia, assim como a Psicologia Social.

Uma questão interessante a se levantar neste momento, é a inversa: qual o papel da Análise do Comportamento na Sociologia?

Assim como é necessário conhecer o organismo que se comporta (filogênese) para se ter uma base para estudar como e porque ele se comporta (ontogênese), também é necessário entender como os organismos individualmente se comportam, para se ter uma base para entender a origem e manutenção de processos sociais (culturais). Nesse ponto, a Análise do Comportamento certamente oferece uma gama de novos paradígmas profícuos para a Sociologia em geral.

Att. Hernando Neves Filho
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Referências

Burgues, R. L.; Bushell, D. (1969). Behavioral Sociology: the Experimental Analysis of Social Process. New York: Columbia University Press.

Guerin, B. (1994). Analyzing social behavior: Behavior Analysis and the Social Sciences. Reno: Context Press.

Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences Science, 213, 501-504 : 10.1126/science.7244649

Glenn, S. S. (1986). Metacontingencies in Walden Two Behavior Analysis and Social Action, 5, 2-8

Glenn, S. S. (1988). Contingencies and metacontingencies: Toward a synthesis of behavior analysis and cultural materialism The Behavior Analyst (11), 161-179 : PMC2741963

Glenn, S. S. (1991). Contingencies and metacontingencies: Relations among behavioral, cultural, and biological evolution. Em P. A. Lamal (Orgs), Behavioral analysis of societies and cultural practices (pp. 39-73). Washington, DC: Hemisphere.

Tourinho, E. Z. (2009). Subjetividade e Relações Comportamentais. Editora Núcleo Paradigma. São Paulo. [Pode ser adquirido no site da editora]

Qual a diferença entre Análise do Comportamento e Behaviorismo?


ResearchBlogging.orgA Análise do Comportamento é uma disciplina científica que tem como objeto de estudo o comportamento sob uma perspectiva contextual e interacionista, tendo como unidade de análise, em nível ontogenético, a tríplice contingência.

Em uma categorização amplamente aceita, Tourinho (1999) caracteriza a Análise do Comportamento como a disciplina geral composta por três grandes eixos.

O primeiro eixo é a filosofia da ciência na qual a Análise do Comportamento é pautada, o Behaviorismo Radical, inicialmente proposto por B.F.Skinner. Se chama behaviorismo pois sustenta que o objeto de estudo é o comportamento, e é radical pois expande a noção de comportamento para além de uma resposta a um estímulo necessariamente público. No Behaviorismo Radical, o comportamento não é meramente o que é observável (a resposta), o comportamento é a atividade do organismo como um todo, interagindo com o seu ambiente, de acordo com sua história de vida. A "caixa preta" que aturdia os primeiros behavioristas foi aberta pela metodologia operante, que esclareceu a intencionalidade, e pela formulação da noção de eventos privados, que possibilitou uma interpretação comportamental sobre emoções e cognições, antes vistos como inexplicável res cogita cartesiana. O Behaviorismo Radical abandona o mecanicismo, tanto da reflexologia dos primeiros behavioristas quanto do homem-máquina da primeira geração de cognitivistas americanos, e adota um modelo causal selecionista em três níveis (filogenético, ontogenético e cultural). Além de filosofia da ciência, o Behaviorismo Radical também pode ser entendido como uma filosofia monista da mente (Lopes e Abib, 2003).

O segundo eixo é a Análise Experimental do Comportamento, que é uma ciência empírica básica. É a principal fonte de tecnologias comportamentais, e tem destrinchado procedimentos respondentes e operantes, de indivíduos e de grupos. A Análise Experimental do Comportamento produz uma vasta literatura técnica acerca da generalidade e especificidade do comportamento de diferentes organismos em determinadas circunstâncias, dentro e fora do laboratório.

O terceiro eixo é a Análise Aplicada do Comportamento, responsável pela aplicação das tecnologias oriundas do laboratório à casos práticos de intervenção social. Tem tido um êxito sem precedentes em suas aplicações em tratamentos de diversos quadros de síndromes e psicopatologias, como o autismo e o transtorno obsessivo compulsivo.

A produção de conhecimento nestes três eixos, em reciprocidade constante, cria o quadro geral da Análise do Comportamento, mesmo que, em muitos casos, cada eixo se desenvolva com relativa indepêndencia dos demais (Carvalho Neto, 2002).

Desta forma, a Análise do Comportamento é uma disciplina regida pela filosofia do Behaviorismo RADICAL que é apenas um entre vários tipos de Behaviorismo. Existem várias dezenas de outros tipos de Behaviorismos, cada um com seus pontos de encontro e desencontro com o Behaviorismo Radical. O'Donohue e Kitchener (1999) oferecem uma listagem compreensiva (e ainda assim longe de completa) dos behaviorismos do século XX em seu livro Handbook of Behaviorism.

Texto de Hernando Neves Filho
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Referências

Carvalho Neto, M. B. (2002). Análise do comportamento: behaviorismo radical, análise experimental do comportamento e análise aplicada do comportamento Interação em Psicologia, 6 (1), 13-18 [PDF]

Lopes, C. E., & Abib, J. A. D. (2003). O Behaviorismo Radical como Filosofia da Mente Psicologia: Reflexão e Crítica, 6 (1), 85-94[PDF]

O'Donohue, W. & Kitchener, R. (1999). Handbook of behaviorism. Elsevier. USA. ISBN: 978-0-12-524190-8. [Lista de capítulos]

Tourinho, E. Z. (1999). Estudos conceituais na análise do comportamento. Temas em Psicologia da SBP, 7(3), 213-222.