Quais os determinantes do comportamento? Em relação à Análise Experimental do Comportamento, a ênfase recai sobre qual fator?

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Primeiramente, definamos o que vem a ser “determinante” para a Análise do Comportamento. Determinantes são relações funcionais. Usualmente, a ciência trabalha com a determinação por “causa-e-efeito”, na qual temos que dada a ocorrência de um evento A, este causa a ocorrência do evento B, garantidamente e dentro de uma relação 1:1. Se eu aplico uma força X em um objeto de massa Y, com atrito W, o objeto se move em uma velocidade Z.

Influenciado por Ernest Mach, Skinner propôs que o comportamento deva ser analisado em termos de funções probabilísticas entre eventos ambientais e do organismo. As relações funcionais não implicam em garantia de 100% de ocorrência do evento B mediante o evento A. O evento B, isto é, o comportamento, pode ser função simultaneamente do fator determinante A, C, D, J, K etc. O comportamento é multideterminado (Chiesa, 2006, p. 96-121). E cada comportamento emitido depende diretamente do ambiente histórico e do ambiente imediato do emissor (Skinner, 1953/2005, p. 31).

Todo organismo é biológico, logo, o comportamento de um organismo depende da história evolutiva daquele organismo, que chamamos de filogênese. É por essa determinação que somos suscetíveis ao nosso ambiente (através de receptores exteroceptivos, interoceptivos e proprioceptivos). A filogênese determina uma porção de nosso comportamento, e dá a base para outras determinações. Neste âmbito estão as causas biológicas do comportamento e os reflexos biologicamente importantes, que outrora foram chamados de instintivos.

Todo comportamento ocorre em um contexto, em um local, em um determinado tempo. Todo comportamento opera sobre o mundo e assim o altera, o que por sua vez, também altera comportamentos subseqüentes. (Skinner, 1957, p.1). As alterações podem ser facilmente identificáveis, como quando você diz algumas palavras doces a alguém que você gosta, e assim recebe um tratamento igualmente afável em retorno. Também podem ser alterações triviais e pouco notáveis, como quando você lembra o nome de um velho amigo após fazer uma pergunta em pensamento sobre a data de hoje, que coincidentemente é a data do aniversário do seu amigo. O contexto evoca, de maneira probabilística, uma determinada gama de respostas. Entretanto, quem se comporta é um organismo, e um organismo, além da história da espécie, também carrega uma história de vida. Dependendo da história de vida, uma pessoa que acorda em pânico numa madrugada silenciosa, sem conseguir movimentar seu corpo, pode achar que está sendo abduzida por extraterrestres, como visto nos filmes, ou estar ciente de que está passando por um episódio de paralisia do sono, como diagnosticado pelo seu médico. Tudo depende do que ela conhece, do que ela acredita, instâncias que dependem inteiramente de sua história de vida. A história de vida do organismo, que chamamos de ontogênese, criada em cima das possibilidades da história filogenética, em contato com um contexto, determinam probabilisticamente o comportamento que ali ocorre, naquele instante. A história cria um repertório de comportamentos, o contexto faz com que determinados comportamentos sejam mais prováveis de ocorrer, e as consequências destes comportamentos os selecionam.

Quando se trata de humanos, grande parte da história de vida do organismo é social, ou seja, ocorre em contato com outros membros da espécie, em uma cultura. O contexto social antecede e ultrapassa a vida de uma pessoa. Práticas culturais são criadas e mantidas pelo comportamento sincronizado de um grupo de indivíduos. Grande parte de nossas práticas culturais são mantidas por comportamento verbal. Graças ao conhecimento acumulado por gerações sobre o efeito de determinadas contingências, hoje todo pai ensina seu filho a escovar os dentes. Inicialmente a criança apenas segue a regra, pois seu pai os demais membros da cultura assim o recomendam. Entretanto, a criança pode manter este comportamento posteriormente pelas suas consequências diretas, como o sabor de uma pasta de dente agradável ou a manutenção da saúde bucal. Em meio social, contextos e consequências de comportamentos de organismos individuais se entrelaçam, produzindo resultados que, por um lado não são produto direto da ação de um indivíduo, mas que por outro, quando em conjunto com outras contingências, criam um efeito a longo prazo que afeta o indivíduo novamente. É o caso do entupimento de um canal de esgoto pelo acúmulo de lixo. Uma criança que joga um pedaço de papel no caminho do esgoto não entope a via. Entretanto, se 50 crianças jogarem, a via entope, e a partir disso (em um mundo ideal) começam as campanhas de educação ambiental.

Os determinantes do comportamento atravessam estes três níveis, de forma inclusiva. Todo comportamento tem parte de sua determinação na filogenia, na ontogenia, e, se tratando de animais gregários como os humanos, na cultura (Moore, 1990; Skinner, 1981). Tendo isso em vista, o Analista do Comportamento realiza um recorte epistemológico, focando no nível que mais tem relevância na determinação de um comportamento específico. Tratando de fobias, sabemos que há um forte componente respondente, já que o estímulo eliciador da fobia, como uma aranha para um aracnofóbico, dispara uma sequência de poderosas respostas fisiológicas, como o aumento do ritmo cardíaco e a ativação glândulas hormonais específicas. Em um caso desses, uma intervenção direta na fisiologia seria improvável, e um tanto quanto incômoda, entretanto, é possível alterar a cadeia respondente a partir de uma intervenção na história de aprendizagem do indivíduo, a partir da aplicação de procedimentos de dessenssibilização sistemática com o estímulo fóbico.

Desta forma, a ênfase é condicional ao problema em questão. Em problemas de intervenção, a ênfase é prática. O foco fica nos determinantes possíveis de serem modificados, que em geral estão no ambiente externo e imediato (já que modificar o passado e o cérebro ainda é material de ficção científica). Em se tratando de pesquisa, o tema é obrigatoriamente tratado em sua multideterminação. Um estudo empírico pode tratar de um foco especial, mas ele deve sempre dialogar com as demais possibilidades de causação.

Att,
Hernando Neves Filho e Rubilene Borges.
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Referências

Chiesa. M. (2006). Behaviorismo Radical: a filosofia e a ciência. Brasília: IBAC Editora e Editora Celeiro.

Moore, J. (1990). On the “causes” of behavior. The Psychological Record, 40, 469-480.

Skinner, B. F. (1957). Verbal Behavior. New York: Appleton-Century-Crofts.

Skinner, B. F. (1981). Selection by consequences. Science, 231, 501-504.

Skinner, B. F. (2005). Science and Human Behavior. B. F. Skinner Foundation. Publicado originalmente em 1953.

Leituras Complementares:

Aló, R. M. (2005). História de Reforçamento. Em J. Abreu-Rodrigues & M. R. Ribeiro (Orgs.). Análise do Comportamento: pesquisa, teoria e aplicação (pp.45-62). Porto Alegre: Artmed.

Andery, M . A. P. A., & Sério. T. M. A. P. (2001). Behaviorismo Radical e os determinantes do Comportamento. Em H. J. Guilhard, M. B. B. P. Madi, P. P. Queiroz, M. C. Scoz & C. Amorim (Orgs.). Sobre Comportamento e Cognição, 7 (pp. 137-140). Santo André: ESETec.

Cirino, S. (2001). O que é história comportamental. Em H. J. Guilhard, M. B. B. P. Madi, P. P. Queiroz, M. C. Scoz & C. Amorim (Orgs.). Sobre Comportamento e Cognição, 7 (pp.132-136). Santo André: ESETec.